quinta-feira, 14 de abril de 2022

Dança

 Não encaixava em mim. Não sou da fé, mas minha necessidade tão humana fez-me criar a própria religião. Sou resultado da miséria que aflinge a experiência da vida. Ser humano é estar em aflição.

    Meu ontem sempre acreditou que a sua projeção futura seria um ser cheio de luz e passional. Alguém que abarcaria a própria dor passada com paciência e sabedoria. A persona que veio a surgir de um anseio, de uma necessidade por acalento em toda a dificuldade e dor que o eu presente estava sentindo. O meu eu de amanhã precisava estar melhor e mais resolvido que o meu eu presente... Não só precisava, mas que também tivesse misericórdia por mim e por todas as minhas tentativas falhas e decisões imaturas. 

    Parcialmente correto... Tenho, sim, as qualidades que antes necessitava, e muitas das questões que rondavam a minha vida naquela época já receberam suas devidas respostas, mas isto não isentou-me de perceber e viver novas perspectivas que colocassem. mais uma vez, em ponto crítico outros cernes que já havia estabelecido como estáveis. Ainda falta-me luz, e vejo que ainda me faltará.

    Hoje olho para o meu passado com compreensão e empatia, mas percebo que este meu passado esqueceu-se de algo: que o caos, a dúvida e a inconstância sempre estariam presentes em sua vida. Vejo-me sendo boa parte da imagem viva que um dia ansiei, mas carrego em meu coração tantas dúvidas quanto antes.

    Abraço, relembro e ofereço toda a empatia para aquele eu que, com um olhar marejado, tanto suplicava por um acalento que diminuísse um pouco a sua ânsia, que necessitava de um pouco de amor. Conduzo minha perspectiva desse meu eu passado nessa dança por vezes calma e serena, mas o faço buscando o conforto do amor que ainda preciso. Danço com este jovem que ainda não sabe que também preciso de ajuda. Danço com a persona que na sua inocência não percebe que este que vos fala é tão humano quanto ele.

    Mas não repetirei essa mesma ingenuidade, pois hoje sei que o meu amanhã também estará olhando para o exato eu de hoje com a mesma, e constante em vida, melancolia não anunciada. 

   Sempre estarei precisando me resgatar.


- Carlos R.

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